Quando Milton Nascimento, o ícone da música popular brasileira de 82 anos, foi confirmado com demência por corpos de Lewy (DCL) na manhã de 2 de outubro de 2025, a notícia espalhou preocupação pelos corredores da saúde e dos palcos. A revelação veio do filho, Augusto Nascimento, em entrevista à revista Saúde em Foco, que contou o momento em que o pai apresentou um declínio cognitivo notório durante a última viagem de motorhome pelos Estados Unidos. O diagnóstico, feito por equipe especializada que incluiu o neurologista Dr. Bertolucci, tem implicações tanto para a vida pessoal quanto para o legado artístico do cantor.
Entendendo a demência por corpos de Lewy
A DCL é a segunda forma mais comum de demência neurodegenerativa, atrás apenas da doença de Alzheimer, e responde por cerca de 10% dos casos de demência no mundo. Ela se caracteriza por depósitos de alfa‑sinucleína — proteínas anormais que se acumulam dentro dos neurônios, formando estruturas chamadas corpos de Lewy. Esses aglomerados atrapalham a comunicação entre as células do cérebro, afetando memória, atenção, habilidades motoras e até o humor. Diferente do Alzheimer, não há marcações claras em tomografias ou ressonâncias; o diagnóstico depende de avaliação clínica detalhada, histórico familiar e observação de sintomas combinados.
Do Parkinson ao diagnóstico de DCL
Milton já carregava um diagnóstico de Parkinson desde 2018, condição que, segundo especialistas, aumenta a vulnerabilidade ao desenvolvimento da demência por corpos de Lewy. O neurologista Dr. Bertolucci explicou que para confirmar a DCL é preciso observar, além do declínio cognitivo, pelo menos dois dos seguintes sinais: alucinações visuais recorrentes, flutuações marcantes no nível de alerta, ou rigidez muscular típica do Parkinson. “No caso do Sr. Nascimento, observamos alucinações leves e variações bruscas de atenção, o que complementa o quadro de demência”, declarou o médico.
Uma homenagem no coração do Rio
Logo após a confirmação, o samba entrou em cena. Portela, a tradicional escola de samba do Rio de Janeiro, prestou uma homenagem a Milton durante o Carnaval 2025Rio de Janeiro. O enredo, intitulado "Cantar será buscar o caminho que vai dar no sol", celebrou a trajetória do artista, reforçando a mensagem de que a música continua viva mesmo quando o corpo fraqueja.

Repercussão familiar e profissional
Augusto descreveu a viagem de motorhome — cerca de 4 mil quilômetros atravessando Arizona, Utah, Idaho, Wyoming e Montana — como um último grande passeio que o pai queria fazer antes de se render ao médico. "Quando percebi que ele já não reconhecia alguns marcos do caminho, perguntei se era loucura embarcar nessa aventura. O médico respondeu que, se existisse loucura, era fazê‑la agora", recordou em tom melancólico. Apesar da aposentadoria formal dos palcos em 2022, Milton ainda aparecia em projetos pontuais e colaborava com jovens artistas, mantendo-se presente na cena musical.
Tratamento e qualidade de vida
Não há cura para a DCL, mas existem estratégias para suavizar os sintomas e preservar autonomia. O plano indicado por Dr. Bertolucci inclui medicação para controlar alucinações e flutuações cognitivas, fisioterapia para manter a mobilidade, terapia ocupacional para estimular as funções diárias e atividade física regular. "O objetivo é garantir que o paciente tenha o melhor nível de independência possível, sem sobrecarregar o sistema nervoso", explicou o especialista.
Impacto social e perspectiva futura
A revelação do diagnóstico de um dos maiores nomes da música brasileira traz à tona a necessidade de maior atenção à saúde mental dos idosos. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz), a prevalência de DCL tende a dobrar nos próximos 10 anos devido ao envelhecimento da população. Milhões de brasileiros ainda desconhecem os sinais precoces, o que atrasa o tratamento e piora a qualidade de vida. O caso de Milton pode servir de alerta para que familiares busquem avaliação médica ao menor indício de mudança cognitiva.

Frequently Asked Questions
Qual a diferença entre demência por corpos de Lewy e Alzheimer?
A DCL apresenta combinações de sintomas cognitivos semelhantes ao Alzheimer, mas com alucinações visuais recorrentes e flutuações marcantes no estado de alerta. Além disso, costuma coexistir com Parkinson, ao passo que o Alzheimer costuma ser mais progressivo e uniforme nas perdas de memória.
Como o diagnóstico afetou a carreira de Milton Nascimento?
Mesmo aposentado dos palcos, Milton ainda participava de gravações e colaborações. Após o diagnóstico, ele tem reduzido compromissos que exigem grande esforço cognitivo, focando em projetos curtos e em sessões de gravação em estúdio com apoio médico e familiar.
Quais cuidados recomendam especialistas para pacientes com DCL?
O tratamento geralmente combina medicamentos para alucinações, fisioterapia, terapia ocupacional e estímulos cognitivos. Manter uma rotina de exercícios leves, alimentação balanceada e atividades sociais também ajuda a retardar o avanço dos sintomas.
A genética tem papel importante na DCL?
Ao contrário de outras demências, a DCL tem um componente genético menos determinante. Fatores como hipertensão, diabetes descontrolada e sedentarismo são mais associados ao risco de desenvolvimento da doença.
O que o público pode fazer para apoiar Milton Nascimento neste momento?
Apoiar a família com mensagens de carinho, respeitar a necessidade de privacidade e, se possível, contribuir com instituições que financiam pesquisas sobre DCL são formas concretas de demonstrar solidariedade ao artista e à causa.
José Carlos Melegario Soares
outubro 3, 2025 AT 06:20A demência por corpos de Lewy representa um véu sombrio que encobre a genialidade de Milton, e não há como negar a tragédia que isso traz ao legado musical brasileiro.