PF desmonta esquema de R$ 900 milhões ligado a deputado Antônio Doido e secretário do Pará para COP30

PF desmonta esquema de R$ 900 milhões ligado a deputado Antônio Doido e secretário do Pará para COP30

A Antônio Doido, deputado federal pelo MDB-PA, e o secretário de Obras Públicas do Pará, Benedito Ruy Santos Cabral, estão no centro de uma operação da Polícia Federal que desmontou um esquema criminoso movimentando mais de R$ 900 milhões em contratos públicos. A ação, chamada de Operação IgapóPará, foi deflagrada na terça-feira, 16 de dezembro de 2025, com 31 mandados de busca e apreensão em endereços ligados ao parlamentar, a policiais militares e a empresas fantasmas. O que começou como uma investigação sobre licitações suspeitas virou um caso de corrupção sistêmica, lavagem de dinheiro e até financiamento ilegal de campanhas — tudo com impacto direto nas obras da COP30Belém, que o estado sediará em novembro deste ano.

Empresas fantasmas e a esposa do deputado

A estrutura criminosa girava em torno de duas empresas: J.A. Construções Civil Ltda e JAC Engenharia. Ambas foram registradas em nome de Andrea Dantas, esposa de Antônio Doido, e de um gerente de fazenda do deputado — pessoas consideradas "interpostas" pela PF para disfarçar o verdadeiro controlador. O que choca é o volume de dinheiro: entre 2020 e 2024, só a J.A. Construções recebeu R$ 633 milhões do governo do Pará. Em 2024, foi a nona maior credora do estado, com R$ 329 milhões em pagamentos. E tudo isso começou em abril de 2020, quando a empresa foi integralizada com R$ 15 milhões em capital social — dinheiro que, segundo a PF, veio de recursos públicos desviados.

Curiosamente, em 2016, Antônio Doido declarou à Justiça Eleitoral ter 5 escavadeiras hidráulicas como patrimônio, totalizando R$ 13,4 milhões. Dois anos depois, exatamente essas mesmas 5 escavadeiras foram usadas por Andrea Dantas para capitalizar a empresa. Um detalhe que não passou despercebido pelos investigadores: não é coincidência. É planejamento.

Propina, saques e campanhas ilegais

Os desvios não ficaram apenas nos contratos. Entre 2023 e 2024, policiais militares suspeitos de atuar como braço armado do esquema realizaram saques em espécie somando R$ 48 milhões. O dinheiro não desapareceu — foi usado para financiar a campanha eleitoral do irmão de Doido, que concorreu a prefeito de Ourém, no interior do Pará, em 2024. A PF encontrou mensagens que mostram claramente o fluxo de propina: "Meu chefe, eu deixei com… eu deixei com a ANDREA". A frase, apreendida em celulares, é a prova viva de que o dinheiro seguia para a esposa do deputado, sob a supervisão direta dele.

Benedito Ruy Cabral, secretário de Obras, é acusado de ter participado de um encontro "oculto, no interior de um veículo" em 24 de setembro de 2024, logo após uma licitação ser declarada habilitada. A PF acredita que ele recebeu propina para garantir que a vencedora fosse uma empresa da esposa de Doido — e não uma concorrente legítima. É um jogo sujo, mas antigo: trocar poder público por dinheiro vivo. O ministro Flávio Dino, do STF, chamou o grupo de "organização criminosa" e confirmou que o esquema era capaz de manipular todo o processo licitatório.

Decisões do STF: o que foi liberado e o que foi negado

Apesar da gravidade, Dino não autorizou tudo o que a PF pediu. Negou o afastamento de Cabral do cargo — por enquanto — e recusou a busca no gabinete de Antônio Doido na Câmara dos Deputados, alegando que "as apurações ocorreram no Estado do Pará". Mas liberou a quebra de sigilos telefônicos e telemáticos do deputado, da esposa, do secretário e dos policiais envolvidos. Também suspendeu o direito das empresas J.A. Construções e JAC Engenharia de participarem de licitações públicas por até 10 anos. Isso pode paralisar obras da COP30 que ainda estão em andamento — e que, segundo fontes da Secretaria de Obras, já têm atrasos de até 40%.

Isso é crucial: a COP30 não é só um evento ambiental. É um projeto de infraestrutura de bilhões de reais. Se as empresas investigadas estão envolvidas em contratos de estradas, pontes e centros de eventos, o risco é que o Pará não esteja pronto. E o mundo estará olhando.

Antecedentes: um histórico de abusos

Antônio Doido já foi inelegível por oito anos em dezembro de 2025, após a Justiça Eleitoral constatar abuso de poder político e econômico nas eleições municipais de 2024. Naquela época, ele tentou se candidatar a prefeito de Ananindeua, na região metropolitana de Belém. Mas o caso de hoje vai muito além da eleição perdida. É o aprofundamento de um padrão: usar o cargo público como máquina de enriquecimento. Em 2016, ele declarou patrimônio de R$ 13,4 milhões. Hoje, sua esposa controla empresas que receberam mais de meio bilhão do Estado. A pergunta que fica: onde está o limite?

Impacto na população e no futuro da COP30

Os R$ 900 milhões desviados não são apenas números. São escolas que não foram construídas. São estradas que não foram recuperadas. São hospitais que não receberam equipamentos. Em um estado como o Pará, onde a infraestrutura é precária e a desigualdade é gritante, esse esquema é um roubo direto da população. E agora, com a COP30 à porta, o mundo verá se o Pará é capaz de sediar um evento de grande porte — ou se será visto como um laboratório de corrupção disfarçado de governo.

O que vem a seguir

A PF ainda está analisando centenas de gigabytes de dados, incluindo e-mails, transações bancárias e registros de câmeras de segurança. A Justiça Eleitoral pode abrir novo inquérito sobre o financiamento ilegal da campanha de Ourém. E o Ministério Público Federal já prepara denúncia criminal contra mais de 10 pessoas, incluindo os dois secretários de estado que assinaram os contratos suspeitos. O próximo passo: a apreensão de bens. Se a PF encontrar imóveis, carros de luxo ou contas no exterior, o esquema pode desabar por completo.

Frequently Asked Questions

Como o esquema afetou as obras da COP30?

Empresas investigadas, como J.A. Construções Civil, receberam contratos para infraestrutura da COP30 em Belém. Com a suspensão dessas empresas de licitações públicas, obras como o novo centro de convenções e vias de acesso já estão com atrasos de até 40%. A secretaria estadual admite que não há contratos alternativos prontos, o que coloca em risco a realização do evento em novembro de 2025.

Por que o ministro Flávio Dino negou o afastamento do secretário Cabral?

Dino argumentou que, embora haja fortes indícios de corrupção, não há prova cabal de que Cabral tenha agido diretamente na assinatura de contratos ilegais. Ele também considerou que o afastamento poderia causar paralisação administrativa no estado. Mas deixou claro que a investigação continua e que novas medidas podem ser tomadas conforme novas evidências apareçam.

O que acontece com os R$ 48 milhões em saques em espécie?

A PF acredita que esse dinheiro foi usado para financiar campanhas eleitorais ilegais e pagar propinas. Os saques foram feitos por policiais militares ligados ao esquema, e os registros bancários já foram rastreados até contas de terceiros. A Justiça pode exigir a devolução desses valores ao erário, mas a prioridade agora é identificar os beneficiários finais — e se há envolvimento de políticos fora do Pará.

Por que a esposa de Antônio Doido é tão central na investigação?

Andrea Dantas não é apenas a esposa — é a pessoa que legalmente controla as empresas que receberam mais de R$ 600 milhões. Ela não tem experiência em construção civil, mas em 2020 passou a ser proprietária de uma empresa com capital de R$ 15 milhões, exatamente as 5 escavadeiras que Doido declarou em 2016. É um claro caso de enriquecimento ilícito por meio de pessoas interpostas, prática comum em esquemas de corrupção.

Existe risco de o esquema se espalhar para outros estados?

Sim. A PF já identificou transferências de recursos para empresas em São Paulo e Minas Gerais, que supostamente serviram de "ponte" para lavagem de dinheiro. Além disso, um dos gerentes da J.A. Construções já trabalhou em licitações no Maranhão. A investigação está sendo compartilhada com o MPF de outros estados, e pode resultar em operações paralelas nos próximos meses.

O que os cidadãos do Pará podem fazer agora?

A população pode denunciar novas irregularidades pelo Portal da Transparência do Pará ou pelo site da PF. Também é essencial acompanhar os contratos da COP30 e exigir publicidade dos gastos. A pressão popular é o único freio eficaz contra a impunidade — especialmente quando o poder público está envolvido.

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